Corpo é pensamento

corrida

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Por Andréa Polo

Há três semanas, participei da Primavera na Vila, do Centro de Formação da Escola da Vila, na qual propus um curso intitulado “Atividades corporais em sala de aula: como e por quê?”. Essa experiência suscitou algumas reflexões que aqui compartilho...

Eu, como propositora, e os muitos professores de várias regiões do Brasil, passamos o dia pensando sobre a necessidade de tratarmos do corpo como um todo, sem a clássica divisão corpo/mente. O corpo? Aquele que por vezes quase não existe dentro da sala de aula e que percebe apenas o pulso do sangue quando corre na aula de educação física? É esta relação que pretendemos? É este o caminho que perseguimos? Perguntei aos participantes qual a parte de seus corpos que avaliavam que mais usavam para dar aula e a maioria respondeu que a BOCA era a “queridinha” dos professores em geral! Outros comentaram que era impossível destacar qualquer parte, mas, quando solicitei que calculassem o tempo que seus alunos passavam sentados em suas cadeiras, na mesma posição, por dia, semana, mês e ano, muitos ficaram assustados!

Basta pensar em nossa vida na escola quando éramos crianças para lembrar que havia hora para movimentar e hora para parar. Mas, parar é ficar estático?

Ouço colegas comentando sobre as “atividades” em contraposição ao tempo livre e me pergunto: Não estaríamos sempre em atividade? Dormir, acordar, andar, comer, pensar, parar... Atividades que, juntas ou separadas, completam nossa rotina. Quando fazemos um cálculo, estamos em atividade, mas quando corremos ou pulamos corda na escola, usufruímos o tempo livremente e estas escolhas não são consideradas atividades.

Ora, são várias as concepções que os docentes trazem para suas salas de aula quando o assunto é corpo e movimento, algumas fragmentadas, que “descorporificam” os indivíduos na medida em que não incluem o corpo e o movimento como parte integral das situações vividas na escola, e outras que olham para essas situações como momentos de explosão: “Depois as crianças voltam mais calmas para a sala”. Então é necessário agitar tanto assim para depois acalmar? Assim, vamos aprendendo a desconsiderar o próprio corpo, as relações infinitas com os demais saberes construídos, e inúmeras possibilidades de movimentos vão ficando cada vez mais “travadas”.

O corpo não é impedimento nem obstáculo para a aprendizagem, muito pelo contrário! Não deixamos o corpo em estado de “congelamento” enquanto fazemos uma lição difícil, assim como não abandonamos nosso poder de síntese quando dançamos! Tudo está interligado, tudo isso junto constitui um indivíduo mais consciente de seus saberes e fazeres. Falar em corporeidade, portanto, é buscar fortalecer um corpo-sujeito, superando o conceito de corpo-objeto a que tanto estamos acostumados.

Enquanto observo meus alunos brincando de imitar animais, vejo flexibilidade, destreza, rapidez, força, mansidão, e não preciso saber fazer igual para favorecer aquelas relações. Meu corpo traz a história dos “meus movimentos” construída na rua onde brincava de amarelinha, pegador e esconde-esconde. Aberta e sensível às necessidades das crianças, promovo temáticas e manifestações que colocam em jogo, no dia a dia da escola, o corpo integralmente participativo: na arrumação de diferentes espaços para brincadeiras, na organização da sala e do parque para propostas específicas, na proposição de desafios advindos da necessidade de cada faixa etária e nas diferentes opções para reconhecer, em si e no outro, as potencialidades de se encontrar na dança, na massagem, no cafuné, num chute bem colocado...

As crianças que sentem infinito prazer em falar sobre as histórias, pensar sobre os números, escolher as tintas que vão usar numa pintura, são as mesmas que usam seu instrumental corpóreo para tomar todas essas decisões. Como disse brilhantemente Edith Derdyk: CORPO É PENSAMENTO.