Um presente neste final de ano: o encontro com a professora Emilia Ferreiro

Emilia Ferreiro
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Por Andréa Luize

“Há mais de trinta anos o livro Psicogênese da língua escrita foi publicado no Brasil. A pesquisa que deu origem a essa obra atuou como um “divisor de águas” no que se refere, entre outros aspectos, à concepção de escrita e ao processo de aprendizagem trilhado pelas crianças. Essas e tantas outras contribuições dessa investigação permitiram a estruturação de uma nova abordagem didática, pautada nos princípios construtivistas, que coloca a criança como sujeito do processo de apropriação da escrita e valoriza as múltiplas interações dela com a cultura escrita, dentro e fora da escola. Porém, mesmo depois de tantos anos, as contribuições dessa investigação ainda não foram totalmente compreendidas por muitos profissionais da área de educação, e ainda é comum se “responsabilizar” a Psicogênese, suas autoras ou mesmo a concepção construtivista por práticas de ensino equivocadas que resultam em sérias defasagens na formação leitora e escritora dos alunos que frequentam e dos que já concluíram a escolaridade básica.

Esses equívocos pedagógicos e essas interpretações deformantes têm favorecido, aqui no Brasil, especialmente, a multiplicação de pesquisas e de propostas metodológicas que seguem na contramão de tudo o que já se sabe e se constatou. Vemos, de novo, a escrita sendo maltratada, como disse tantas vezes a professora Emilia, ‘sendo vista como um código a ser ensinado pelo domínio de uma técnica’. Vemos tentativas de separar o que não se separa: as práticas de escrita do sistema que usamos para elas. E, o mais complicado, é novamente vermos a criança ocupando um lugar de ser passivo diante da língua escrita, à espera, agora, de alguém que lhe diga quando pensar sobre o sistema e quando pensar sobre a língua escrita.

Chegamos a um bom momento, então, para validar tudo o que a Psicogênese nos permitiu aprender, para conhecer novas e importantes investigações que nos permitem entender cada vez mais os processos de aprendizagem e assim continuar investindo na construção de aportes didáticos. E também é hora de enxergar definitivamente que estamos no século XXI, com novas demandas na formação de leitores e escritores, e diante de crianças que, felizmente, pensam sobre o objeto que desejam ansiosamente compreender e que − pasmem!−, já lidam com a escrita desde muito cedo e são, em muitos casos, capazes de escrever seus primeiros textos usando um teclado de tamanho mínimo e digitando com os polegares, dedos que, como disse recentemente a professora Emilia, ‘sequer imaginávamos, um dia, usar para este fim!’.

Esta manhã será, então, valiosa para nós, educadores, pesquisadores e formadores de professores, pois a palestra da professora Emilia certamente nos ajudará a enfrentar todos estes desafios.”

Foi com palavras semelhantes a essas, que tive a honra de abrir os trabalhos no Seminário Internacional, promovido pelo Centro de Formação da Escola da Vila, no último sábado, dia 8/11: uma honra e um enorme presente também, afinal, era uma oportunidade de estar em contato com uma grande mestra, quando o tema é a alfabetização, o ensino da leitura e da escrita – justamente meus temas de maior interesse!

As preciosas contribuições trazidas pela professora Emilia foram fundamentais para validarmos conhecimentos já construídos e explicitados, como o papel das crianças como sujeitos pensantes, e, ainda para, como educadores, ficarmos atentos e nos posicionarmos em relação ao que está por trás de “novas” propostas pedagógicas ou mesmo de programas e políticas públicas.

Emilia Ferreiro, estabelecendo as mais distintas relações que sua vasta e rica experiência investigativa permitem instigou, com sua palestra, nosso interesse, nos aproximou de temas complexos, contribuindo mais uma vez, e como sempre, para que possamos ser melhores alfabetizadores.

Um presente esse Seminário!

Dentre os 540 participantes desse evento, profissionais vindos de diferentes regiões do Brasil, incluíam-se educadores da Escola da Vila e, muitos deles, assim como eu, se sentiram também recebendo um presente de final de ano, o que os comentários a seguir permitem observar:

“Foi um enorme privilégio compartilhar alguns momentos de escuta e reflexão a respeito do papel da escola, no início do século XXI, com a professora Emilia Ferreiro.
Sua dedicação à pesquisa, seu entusiasmo e amplo conhecimento são fonte de inspiração para que todos nós, educadores, possamos seguir em frente em busca de novos desafios.” (Alessandra Zanetti - professora do Grupo 3) 

“A fala de Emília Ferreiro traz uma lucidez política educacional que nos faz refletir acerca da responsabilidade que temos em nossas mãos: trabalhar com educação.
A contribuição vinda de suas pesquisas já é de infinito valor para a transformação no modo como as crianças são inseridas no contexto alfabetizador. Vê-la falar de questões e desafios tão atuais é inspirador para seguir estudando e ter a certeza de que sempre temos algo novo a aprender.” (Juliana Karina Oliveira - professora do Grupo 2) 

“Ouvir Emilia Ferreiro não é escutar uma pesquisadora isolada em um ambiente de investigação. Escutar Emilia Ferreiro é escutar as crianças, escutar os alunos. Do começo ao fim ela nos passa a mensagem de que tudo o que fazemos na escola busca o protagonismo das crianças, busca a compreensão de como pensam, para que a partir de considerarmos suas colocações, se tornem sujeitos que saberão expressar-se sempre que desejem. Ouvir Emilia Ferreiro é um apelo constante a nunca nos esquecermos de ouvir permanentemente, e em todas as entrelinhas, os nossos alunos!” (Miruna K. Genoíno - professora formadora do 1º ano) 

Meu desejo é de que esse Seminário não se esgote em si mesmo e nos mobilize, afaste a possibilidade de passividade diante de todas as questões atuais no universo da educação brasileira, especialmente aquelas referentes à formação de leitores e de escritores!