Passagem dos alunos do 9º ano para o Ensino Médio

9ºs anos

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Por Susane Lancman Sarfatti

Momentos de passagem são propícios para a reflexão. Assim, a passagem dos alunos do 9º ano para o Ensino Médio é um ótimo momento para pensar: “Que tipo de aluno tenho sido? Que tipo de jovem venho me tornando? Estou satisfeito com as minhas escolhas?”.

São muitas as etapas que compõem esse processo de reflexão: conversa com os orientadores, questionário, dinâmica com os alunos veteranos do Ensino Médio, avaliações e, por fim, uma entrevista entre cada aluno e sua família com a equipe do Ensino Médio.

O jovem aluno do 9º ano está em sua sala de aula quando é chamado por uma monitora para comparecer à sala de reuniões. Lá, encontra sua família. Todos estão reunidos para falar desse momento de passagem. Há uma tensão no ar! De todas as partes. Somos desconhecidos. O tempo é restrito para uma conversa que deve ter seu tom de seriedade, um tanto de informação e espaço para revelações. São singelos 30 ou 40 minutos em que aparece angústia com o que está por vir, medo dos novos desafios, surpresas com o desempenho nas provas de passagem, análise de percursos, choro de emoção de pais e alunos, e algumas risadas de descontração. “Minutos intensos”, foi o que escutei de muitos entrevistados ao final do encontro.

Uma aluna entra na sala de reuniões e pergunto: “Como se sente estando prestes a entrar no Ensino Médio?”. Ela me olha como se eu estivesse fazendo uma pergunta sem nexo, e me diz: “Estou tranquila”. Com esses exatos 5 segundos iniciais, já é possível traçar o roteiro da entrevista: a tranquila jovem precisa compreender o significado desse momento de passagem para que possa ter mais tempo de elaborar o que está sendo finalizado e o que está por vir.

A classe que frequenta há 4 anos deixará de existir, muitos amigos estarão em salas diferentes no ano seguinte, das 8 disciplinas curriculares passará a ter 11, dos velhos conhecidos professores do Fundamental 2 não sobrará nenhum para dar aula no ano seguinte, do conhecido prédio em que sabe seus detalhes irá para um prédio novo com tanto para descobrir, da posição de aluna mais velha do Fundamental será a pirralha do Ensino Médio, o grau de exigência e profundidade em relação aos conteúdos que vêm crescendo ano após ano terá um salto considerável...

Enfim, não estamos em momento de maré tranquila, e é preciso que os alunos percebam isso para se preparar. Depois de 35 minutos de conversa, a aluna me questiona: “Seu objetivo era me deixar nervosa?”. “Em certo sentido, sim”, respondo. “Então, você conseguiu”, ela diz sorrindo. Ufa! Objetivo cumprido, que venha a próxima!

A porta se abre e entra um aluno escoltado pelos pais. A mãe senta-se de um lado, o pai do outro, e o filho entre os dois. Faço a pergunta de praxe: “Como se sente estando prestes a entrar no Ensino Médio?”. O menino olha para seus portos seguros e, com um meio-sorriso, diz: “Muito nervoso”. Ele passa a contar o que os irmãos mais velhos lhe dizem em casa em relação ao Ensino Médio, e há um certo tom de terror: “Tudo lá é MUITO mais difícil”. Os pais olham com pena para o filho caçula, parecem também sofrer. Assim, durante a conversa, o foco é desmistificar ou dimensionar o tamanho do MUITO, que para alguns alunos toma o tamanho de um monstro tão grande, que pode ser paralisante. Uma estratégia é analisar o processo de aprendizagem do Fundamental 2, e as provas de passagem do aluno em questão e fazer uma projeção do tamanho do desafio. No final do encontro o aluno me pergunta: “Então, você está me dizendo que o desafio não vai ser tão grande?”. “Veja bem, não faço profecia, mas a projeção para o Ensino Médio em relação ao seu desempenho me parece boa, você sempre foi um excelente aluno, não é mesmo?”, respondi. Às vezes é preciso reafirmar o óbvio para dar segurança nesse momento de passagem.

Um assunto frequente trazido por alguns dos alunos nesses encontros é a “injustiça pedagógica”. Muitos querem entender por que estudam muito e o desempenho é baixo, enquanto outros estudam menos e têm melhor desempenho. Isso não é dito em tom racional e como mera curiosidade, ao contrário, as lágrimas rolam e o tom de revolta aparece na frase:  “Isso não é justo!”. Pois é, a questão é complexa, são muitos os fatores que explicam a maior ou menor dificuldade do aluno em determinado conteúdo escolar e, em 30 minutos, o que é possível discutir é o grau de disponibilidade de aprendizagem que o aluno pretende ter no Ensino Médio para continuar avançando. A fórmula EMPENHO E DESEMPENHO não parece mesmo muito justa, então, nos resta calibrar o empenho para ter maior desempenho, mesmo que a calibragem de cada aluno seja muito diferente. “Abaixo a injustiça pedagógica! Eu também apoiaria o manifesto que uma aluna disse que iria fazer.

Depois de aproximadamente oitenta entrevistas, sinto que também vivi um turbilhão de emoções participando da história de cada um dos alunos e de seus familiares.

Infelizmente, não será possível me lembrar de todos os detalhes ali vividos, mas terei a oportunidade de acompanhar e participar da história que cada um desses alunos irá construir no Ensino Médio.