O coletivo e o conhecimento

Escola da Vila

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Por Clarice Gil Barreira Camargo

Pois o que é próprio do homem não é tanto o
mero aprender, mas o aprender com outros
homens, ou ser ensinado por eles.
(Fernando Savater, O valor de educar, p. 39)

Historicamente, a escola, como instituição de ensino coletivo, surge da demanda social de educar um grande número de pessoas de uma só vez.

Em nossa visão, a maior vantagem de nos reunirmos em grupos não está relacionada à praticidade ou produtividade, mas a um aspecto determinante para a aprendizagem humana, e que Savater está ressaltando no trecho acima: a possibilidade de interagir com o outro e assim aprender mais e melhor.

Uma das mais importantes finalidades da educação não é apenas promover a aprendizagem de certos conteúdos, mas garantir que os alunos dominem os meios necessários para continuar seus processos de aprendizagem por toda a vida. Para isso, é essencial que esses alunos desenvolvam as competências necessárias para estudar e, por isso, diariamente, se reúnem com os colegas de classe para ler, discutir, pesquisar, resolver problemas, entre outros, a partir da orientação e supervisão de um adulto, o professor.

Porém, se o objetivo é desenvolver a autonomia no processo de aprendizagem, é necessário que saibam estudar também sem uma tutela externa, tomando decisões a respeito de seus próprios caminhos, de forma consciente e produtiva.

Essa autonomia não se produz como um mero efeito da passagem de tempo na escola, ela deve ser desenvolvida por meio de um trabalho pedagógico intencional, e aqui chegamos ao assunto principal deste texto. São muitas as propostas que fazemos ao longo da escolaridade para favorecer o desenvolvimento da autonomia nos mais diversos âmbitos, em especial no que diz respeito ao estudo. Como uma das propostas deste ano, para os alunos do 8o ano, organizamos grupos de estudos na semana de provas trimestrais. Elegemos duas matérias e convidamos os alunos para se reunirem na escola e estudarem com os colegas, duas tardes da semana.

Qual é o objetivo desse grupo?

Os alunos se inscrevem com o objetivo de estudar para a prova trimestral que se aproxima, mas como quase todas as situações de ensino/aprendizagem desenvolvidas na escola, o nosso objetivo vai um pouco além. Queremos, assim como eles, promover um momento de estudo que colabore para a aprendizagem de um conteúdo, mas também que o próprio estudo seja um conteúdo. Queremos que nossos alunos aprendam a estudar.

E como funcionam os grupos de estudo?

Se estamos tratando o estudo como conteúdo e objetivamos desenvolver a autonomia dos alunos, é importante que esse espaço seja essencialmente gerido por eles. A qualidade do estudo, dessa forma, depende da qualidade da preparação e da organização deles. Por essa razão, não é possível participar do grupo sem trazer o material completo, sem antecipar parte do trabalho identificando suas dúvidas, preparando resumos, realizando a OE entregue pelo professor etc. Não há, ali, um adulto que vai ensinar a matéria, fazer uma revisão ou oferecer novos materiais. A equipe de orientação os acompanha e apoia em caso de necessidade, mas são os próprios alunos que gerem seu estudo.

No início do encontro levantamos temas que podem ser escolhidos como foco. Cada um avalia sua própria necessidade e se inscreve no grupo de um dos temas. Os grupos devem planejar como vão desenvolver o estudo e desenvolvê-lo.

E o resultado?

Ninguém melhor do que os próprios alunos para nos dizerem quais as vantagens e desvantagens dessa proposta. E aqui vale ressaltar: nos interessa saber o que eles pensam, porque nos interessa que eles reflitam sobre as experiências. Além de aproveitar ou não desses momentos de estudo, queremos que eles saibam analisar se aproveitaram ou não, o porquê, e queremos que eles possam, inclusive, decidir se o estudo em grupo funciona para eles ou não.

Como vantagem mais evidente do trabalho coletivo, os alunos identificam a possibilidade de tirar dúvidas com os colegas e compartilhar conhecimentos. Mas, além disso, os alunos percebem, por exemplo, que estar com o outro contribui para maior tomada de consciência a respeito de seu próprio saber. Você já se viu na situação de saber algo e quando lhe pedem para explicar a coisa se complica? Ter um interlocutor contribui para descobrirmos o quanto estamos preparados para falar, expor, discutir, analisar um assunto, coisa que o estudo sozinho não permite.

Por outro lado, estudar em grupo pode ser desafiador, em especial para alunos mais novos, porque estão entre amigos, e muitas vezes se dispersam. Desenvolver autocontrole em relação a isso, conseguir manter o foco, ser capaz de dirigir um grupo para que funcione bem são habilidades importantes de se desenvolver, e isso só é possível tentando e errando.

Veja abaixo alguns depoimentos dos participantes:

Ganhando maior experiência e autonomia, nossa expectativa é a de que os alunos passem a se programar para estudar em grupo, independentemente desse espaço. Que possam se reunir na casa de alguém, na biblioteca da escola ou mesmo por Skype, como já fazem muitos dos alunos de 9o ano. E que nesse processo eles aprendam muito sobre ciências naturais, matemática, língua portuguesa, geografia ou história, mas aprendam muito também sobre aprender.