Famosxs da internet

Digital beggar por Eduardo Salles
Ilustração de Eduardo Salles

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Por Helena Mendonça

Você conhece a Giovanna do forninho? Ou a Chloe, que, em um vídeo caseiro, não entende por que sua irmã chora com a notícia recebida da mãe? A notícia do encontro dessas duas personagens que ficaram famosas ao se tornarem sucessos virais na internet causou estranhamento em muitos que não acompanham a avalanche de memes* das redes sociais. Elas se tornaram personagens principais ao divulgarem uma grande marca de tecnologia, que propunha uma busca na internet, para quem não as conhecia. Uma boa jogada de marketing que traz à tona o vazio e a rapidez com que os famosos da internet vêm e vão.

Assistindo aos vídeos que as fizeram famosas, podemos citar o que a Profª Paula Sibilia apresenta em seu livro “O show do eu”¹. Uma das ideias trata do desejo da exaltação da própria vida com o crescente acesso às mídias e redes sociais e de como a capacidade criativa da sociedade e a curiosidade sobre a vida alheia se tornam uma mercadoria. O que é ser famoso? O que é ser um influenciador? Esse também foi tema de um dos vídeos do Porta do Fundos recentemente. Uma entrevistadora que tenta entender o porquê da “famosidade” de uma pessoa que se tornou sucesso na internet, mais especificamente no Instagram e Snapchat. Algumas das perguntas da entrevista: “Por que as pessoas curtem as suas fotos? Quem é você? Por que você é famosa?” E a resposta: “As pessoas começaram a curtir e depois outras curtiram porque as primeiras curtiram e aí eu fiquei famosa...”.

Para além de ter um canal no YouTube, saber editar um vídeo, tentar entender o que dá mais curtidas e conhecer estratégias para que os espectadores vejam o vídeo até o final, é fundamental questionarmos esse movimento, analisarmos os vídeos construindo critérios com os estudantes, discutindo sobre o tema e levando em consideração que a maioria dos jovens segue, assiste e compartilha esse material. Eles participam desse movimento, surfando nessa onda muitas vezes sem se questionar sobre os valores envolvidos nessas ações.

Por causa dessas e outras práticas particulares do mundo digital, é fundamental que as práticas educacionais sejam revisitadas. Temas como a pesquisa, seleção e apresentação de dados encontrados na web, a criação de produtos digitais e seus diferentes formatos e formas de representação, a comunicação e as redes sociais, o trabalho e a economia, bem como o ativismo social digital, são alguns dos temas que também devem estar presentes na escola. Um dos documentos que temos usado como referência de currículo de educação digital para os alunos traz como uma das habilidades da convivência digital a compreensão do impacto social das tecnologias digitais. Entender e avaliar a capacidade que as tecnologias têm de impactar positivamente ou negativamente os indivíduos e a sociedade em suas questões sociais, econômicas e culturais é um dos temas de trabalho que constroem a formação do estudante. Outros temas igualmente importantes são a proteção da informação digital pessoal e de outros, o respeito ao direito de privacidade, o reconhecimento de dilemas éticos e as consequências legais no uso e na apropriação de material digital, bem como o impacto do digital no direito de propriedade intelectual.

A atenção à qualidade do material que é oferecido às crianças e aos jovens não é algo novo, a programação da televisão foi um grande motivo de discussão na época da sua popularização. Talvez a maior diferença agora seja a possibilidade de criação de material, agora digital; criação esta que se torna possível com ferramentas cada vez mais acessíveis, fartos canais de distribuição e um enorme público à disposição.

Nesse sentido, a escola tem promovido diversas ações visando a construção de conhecimento com o digital, levando em consideração também as questões didáticas que são impactadas por essa mudança. Essas ações vão desde o aprendizado técnico de recursos disponíveis para diferentes fazeres, passando pela formulação de critérios de produção, análise de referências, contato com diversas possibilidades, até a discussão sobre temas mais ligados ao universo digital, mencionados acima, a criação individual e coletiva e finalmente publicação e a interação com os diferentes públicos. Assim esperamos formar estudantes conscientes e críticos perante o universo digital.


(*) Memes: imagens ou vídeos que são remixados pelos usuários e se tornam virais, ou seja, são compartilhados por muitas pessoas, às vezes remixados e compartilhados novamente.

¹SIBILIA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

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