Quero dar um zoom!

Regina Izzo e Daniela Munerato

Memórias nos fazem felizes ou tristes! Pode ser um cheiro, uma música, uma imagem. A memória acontece através das experiências vividas e do significado que atribuímos a elas. Um grupo de pessoas participa de uma mesma situação e tem diferentes lembranças do acontecimento. Além de características distintas, das diferenças que nos singularizam, o que está em jogo é a afetividade, o sentimento!

As fotos cumprem um papel importante nas nossas memórias. Elas registram fatos, eventos e servem justamente para evocarmos as situações como um todo. Olhamos a foto de uma apresentação e lembramos de tudo, desde o primeiro ensaio, acertos e improvisações. Inevitavelmente, o sentimento acontece: a saudade, a pontinha de medo, a felicidade por ter conseguido enfrentar o desafio... Porém, vale lembrarmos que só somos capazes de retomarmos as situações e os sentimentos envolvidos se os tivermos vivenciado.

Com a popularização da câmera digital, todo mundo tem muuuuita foto! Fica difícil registrarmos os momentos em poucas imagens: é tão fácil, rápido! E selecionar as imagens então? São tantas variáveis: ângulos possíveis, a luz, os efeitos. Fica tão difícil escolher, que na maioria das vezes nem imprimimos ou mandamos revelar, deixando sempre este momento para depois. Fica lá guardado no computador para algum dia - se esse dia chegar -, termos acesso. Toda a novidade gera adaptações!

A era digital nos traz outro problema: estamos tão focados nos registros que perdemos a oportunidade de vivenciarmos as situações. No ano passado ouvimos o desabafo de uma família sobre a dificuldade de observar seu filho num evento da escola. Segundo o relato destes pais, a enorme aglomeração em busca do registro digital impedia a visão da apresentação. Os pais que fotografavam viam seus filhos através das câmeras. Já as crianças, muitas devem ter buscado os olhares emocionados de seus pais, mas talvez não tenham conseguido encontrá-los.

Pensemos juntos: as crianças, em dia de apresentação, passam por diversas emoções: precisam se apresentar diante de um público grande, às vezes desconhecido. Querem fazer bonito, com certeza. Sabem que há expectativas em torno de sua performance, mesmo que isso não tenha sido dito a elas. Os professores, por sua vez, são sempre portos seguros, mas para encontrar o conforto, a criança também busca sua família na platéia. Então, o que ela espera? Espera poder identificar onde estão seus pais e olhá-los sempre que der, para ver se estão gostando e acompanhando cada movimento. A apresentação é para eles! Mas o que ela vê? Um monte de pais atrás de câmeras fotográficas!

Nossa reflexão vai na seguinte direção: a facilidade de registrar não pode substituir o que fundamenta a memória. Se não houver sentimento, será apenas uma foto. Que tal aproveitar estas oportunidades – seja na Festa Junina ou no Festival de Música -, junto aos filhos, para ouvir, participar, marcar presença e, se der, registrar, naquela clássica pose que os professores sugerem que as crianças façam no final, através de fotos.

As crianças se preparam tanto para estes olhares! Além disso, fazemos todos parte de uma comunidade, e devemos considerar que dividimos o espaço com diversas famílias (e olhares) que partilham do mesmo desejo.

E que as fotos nos tragam, sim, ótimas memórias: de um dia divertido, dos amigos que compareceram e de suas famílias. E que entre uma foto e outra, além de se lembrarem da apresentação em si, se lembrem da emoção manifesta nos olhares de seus pais, dos sorrisos de satisfação, dos acenos que “diziam”: estamos aqui! Enfim, memórias.

Aproveitamos a oportunidade para sugerir a leitura de um livro que no nosso entender é para todas as idades: Guilherme Augusto Araújo Fernandes, escrito por Mem Fox e Julie Vivas, da Editora Brinque-Book. Trata-se da história de um menino que era vizinho de um asilo de idosos e que soube que uma das senhoras tinha perdido a memória. É lindo e seu conteúdo guarda relação com a reflexão que propomos neste post. Aproveitem!