Tiago Lima

 

Como você entrou na escola da vila?

Sempre tive um interesse pelo tema da educação. Porém, durante a faculdade de psicologia que cursei na USP, fui desenvolvendo um vínculo com a psicanálise e a clínica, fazendo grande parte dos meus estágios e estudos nessa área. Um dos últimos desses estágios foi na Associação Lugar de Vida, instituição de abordagem psicanalítica que se dedica ao trabalho com crianças com transtornos de desenvolvimento, como o autismo, numa proposta de articulação entre psicanálise e educação. Apesar do engajamento com essa prática, que acabou resultando numa pesquisa de mestrado, ainda tinha vontade de me aproximar do ambiente escolar de forma mais direta. Assim, quando fiquei sabendo por meio da Irene, colega minha na faculdade, de uma vaga para assistente na Orientação Educacional na Escola da Vila, vi que era a oportunidade de experiência que poderia satisfazer essa antiga curiosidade. Em seguida, já na escola, essa curiosidade continuou e continua se renovando. Na minha opinião, é um trabalho riquíssimo e que, felizmente, nos coloca permanentemente questões, mobilizando a reflexão.

Como vê sua preparação para assumir o cargo que hoje ocupa? Da sua experiência fora da escola, o que mais te ajuda no trabalho escolar?

Acho que tive a sorte de no meu percurso institucional como assistente poder trabalhar com pessoas não só muito competentes, mas que também passei a admirar pela postura ética e de envolvimento com o que faziam. Pude trabalhar com orientadores diferentes, o que acho que foi positivo para minha formação, pois possibilitou que eu acompanhasse além de grupos de alunos diversos, também estilos diferentes de ser Orientador - dentro daquilo que define essa função na escola. Assim, passei por um período com o Chicão nos 8ºs e 9ºs da Unidade Butantã, outro no Fundamental 2 do Morumbi trabalhando com a Susane e ainda outro momento acompanhando a Angela Crescenzo. Foram oportunidades de troca e aprendizados que valorizo muito.
Paralelamente ao trabalho na escola, continuei com a atividade clínica no consultório. Certamente são posições muito diferentes, a de psicoterapeuta ou analista e a de orientador. Porém, do ponto de vista da formação, acho que foram complementares. Atendi no consultório, além de adultos, também jovens, crianças e adolescentes; no Lugar de Vida, tinha tido experiência de trabalho com grupos de crianças. De modo que o principal desafio para mim era conseguir estabelecer e internalizar essas duas posições distintas, de clínico e educador, dentro de um estilo próprio.

Em ambas, o saber desempenha um papel fundamental, já que é a partir dele que os pacientes ou os alunos estabelecerão seu vínculo. Porém, no consultório é interessante que o saber que o paciente supõe ao analista se manifeste na sua forma singular de se relacionar com o outro, tornando-se material de análise. Na escola, por sua vez, o olhar da psicologia também ajuda, já que também estamos diante de formas singulares de se relacionar com o outro e o saber, mas aqui a posição é positiva, no sentido de oferecer, como educador, uma orientação dentro da qual a identificação faz parte. O limite (e a beleza da coisa) é que cada um faz com isso o que quiser e não se pode acompanhar que destino cada aluno dá àquilo que se propõe ao aprendizado.

a
O que identifica como preocupações centrais dos pais dos alunos das séries que acompanha?

No Fundamental 2 me parece que o desafio do adolescente é conseguir construir esse lugar de autonomia em que ele vai sendo gradativamente colocado. Não só pela escola ou pelos pais, mas também com relação ao grupo, já que ele é convocado a elaborar uma identidade mais complexa, já que a identidade que tinha na infância - ainda muito determinada pela família - já não dá mais conta do meio social da adolescência. Conseguir fazer isso envolve um rompimento então com os pais, e inclusive com a imagem que tinha enquanto aluno, que será em menor ou maior grau dependendo do caso. Para a escola e para os pais, portanto, é colocada permanentemente a questão de o quanto devemos interferir, cuidar ou permitir que o adolescente explore esse universo em que está agora mais sozinho (inclusive no ponto de vista do próprio adolescente). Penso que o trabalho da Orientação Educacional no Fundamental 2 está assentado nessa tensão. Nesse sentido, a parceria da OE com a família é fundamental para que nós, adultos, estabeleçamos uma postura clara e coerente com relação ao adolescente, limitando esse espaço para exploração, deixando claras as possibilidades de escolha e os deveres.