Orientação de EI e F1 do Morumbi, a experiência como base para o trabalho do Orientador.

Daniela Munerato e Adriana Reali

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Desde o ano passado, Daniela Munerato é Orientadora da Educação Infantil da Unidade Morumbi, segmento em que a orientação se ocupa tanto do trabalho educacional, quanto da formação das professoras e Adriana Reali tem a função de Orientação Educacional das turmas iniciais do F1. Ambas estão na Escola da Vila há muitos anos e contam um pouco do trabalho que realizam como Orientadoras.

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Da sua experiência anterior o que mais  ajuda no trabalho escolar?

Daniela - Trabalho em escola desde os 15 anos de idade. Minha mãe tinha uma escola e como fazia magistério peguei minha primeira turma bem cedo. Quando me formei em Psicologia trabalhei em consultório durante um tempo, atendia crianças e adultos, sempre casando os trabalhos entre escola e consultório. De qualquer forma, os diferentes olhares que a prática e o estudo me proporcionaram, dentro e fora da escola, foram fundamentais no trabalho que realizo hoje.

Como Psicóloga (me formei na abordagem Cognitiva Construtivista) vejo a observação como um ponto fundamental que favorece o olhar individualizado, que nos faz compreender como as relações e os conhecimentos acontecem e se transformam ao longo de nossas vidas. Ainda neste olhar precisamos considerar a idade das crianças, as particularidades, as dinâmicas familiares e afetivas.

Entrei na Escola da Vila em 2001. Fui contratada como estagiária da Ed. Infantil na Unidade Morumbi. A professora era a Adriana Reali. Nossa parceria, inaugurada nesse momento, hoje assume outra forma não menos importante! No ano seguinte assumi um Grupo 2 como professora na Unidade Butantã onde fiquei até 2010. Neste percurso fui convidada para ministrar cursos pelo Centro de Formação em diversos temas: Formação de Grupo, Oralidade, Matemática, Adaptação, Nomes próprios, entre outros.  Em 2011 assumi a Orientação Educacional da Ed. Infantil na Unidade Morumbi e este ano ingressei na equipe de professores da Pós-Graduação em Educação Infantil da Escola da Vila.

A minha experiência como professora me possibilita entender muito bem situações trazidas pelas professoras no dia a dia.  As aflições ou dúvidas são partilhadas e muitas vezes já vivi algo semelhante,  juntando um repertório de possibilidades interessante. Sempre digo que não há receitas, mas muitas tentativas para acertarmos. Para fomentar este auxílio que posso dar aos professores, o estudo permanente é algo muito presente. Nossas ações precisam ter bases teóricas que ficam muito mais ricas quando relacionadas à prática. Neste sentido, levantar possibilidades e sugerir um autor que nos faça avançar nas reflexões sobre assuntos de naturezas diversas é sempre um bom caminho.

No meu percurso estudante, busquei fazer disciplinas com o professor Ives de La Taille na USP, Psicologia, sobre temas que eu estudava com frequência e desejava ir sempre além. Mantive uma interlocução próxima com ele e até combinamos de eu fazer mestrado sob a sua orientação.

Outra professora que representa uma importante referência para mim é a Maria Teresa de Sousa, que trabalha com o Ives e fala muito de desenvolvimento infantil e Piaget.

Atualmente, ministro disciplinas na pós-graduação em Educação Infantil pelo Centro de Formação da Escola da Vila, outra função que está muito ligada a formação de professores e que também reflete nas orientações que faço com as professoras que oriento.

Também não posso deixar de comentar que a relação que sempre mantive com a Orientação quando professora, também me ajuda na função de hoje! Sempre tive uma relação muito aberta com a Dayse: parceria mesmo. E é este tipo de relação que mantenho com as professoras que oriento.

Adriana - Sou pedagoga formada pela Universidade Mackenzie e atualmente faço um curso de pós-graduação em Psicopedagogia Institucional. Trabalho com educação desde 1989, quando iniciei minha carreira como professora numa pequena escola próxima a minha casa. Desde então descobri minha verdadeira paixão: educar. Na Escola da Vila estou desde 1996. Iniciei como professora estagiária na Unidade Morumbi. Nessa função permaneci por dois anos. Em 1998, fui convidada pela escola para assumir como professora titular minha primeira turma de grupo 1, na Unidade Butantã. Em 2000 retornei a Unidade Morumbi. Permaneci na Educação Infantil dessa unidade por mais oito anos e desde 2008 atuo no Ensino Fundamental 1. Atuei como professora de 1º e 2º anos por mais 3 anos e desde 2011 atuo na função de Orientadora Educacional das séries iniciais desse segmento.

Foram 21 anos em sala de aula, atuando diretamente com os alunos e com as famílias em porta de sala, compartilhando com minhas orientadoras o trabalho, os encaminhamentos, as diferentes situações vividas a cada dia. Não tenho dúvidas que essa experiência contribuiu para minha formação para o trabalho como Orientadora.

Ao longo desses anos, a troca com outras professoras, com os orientadores, as leituras realizadas, o estudo, o trato com cada criança especificamente e com o grupo, com cada família e com todas elas, diferentes umas das outras, contribuíram significativamente para o trabalho que realizo hoje na escola. A familiaridade com a sala de aula, com os alunos e a proximidade com as professoras fazem o meu trabalho hoje mais vivo, mais intenso.

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Como vê sua preparação para assumir o cargo que hoje ocupa?

Daniela - Vejo-me bem preparada, mas sempre penso que podemos ir além. Enquanto professora da Educação Infantil eu já desejava um desafio maior, no qual eu pudesse utilizar todo o meu conhecimento e seguir estudando sobre outros assuntos relacionados a Educação. Poder utilizar os conhecimentos aprendidos no magistério, na Psicologia, Psicopedagogia sob outro olhar!

Adriana - Além dos anos em sala de aula, os estudos e discussões sistemáticas que temos na equipe de Orientação também têm me ajudado a construir um repertório para assumir essa função. Seguir estudando é o meu foco. Hoje me dedico a pós em  Psicopedagogia, que  me oferece um olhar mais distanciado da sala de aula, o que, certamente, contribuirá com o trabalho das professoras que oriento.

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Citem os aspectos do trabalho que mais as desafiam

Daniela - O atendimento aos pais é instigante e desafiador: é diferente do consultório onde “cuidamos “ da história de cada um. Aqui, além desta questão, estamos inseridos em um contexto único, a escola. Cada um tem um olhar diferente sobre este contexto. Ouvir, orientar e lidar com o que agrada e desagrada sempre é um desafio. O pilar deste relacionamento é justamente o conhecimento que precisamos ter do trabalho realizado, da participação dos alunos e o vínculo que precisa estar estabelecido entre nós.

Sobre o trabalho com as professoras: conduzir cada uma como eu fazia com os meus alunos. Considerar os conhecimentos prévios de cada professor, olhar para o que pode avançar do ponto de vista pedagógico e educacional, acompanhando percursos, dando colo ou pontuando aspectos a serem avançados ou superados quando necessário.

Adriana - Sem dúvida nenhuma o que mais me desafia é o trabalho com as famílias. Cada uma com suas particularidades, desejos e anseios dentro de um espaço único, comum a muitas famílias.

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Como é conciliar o trabalho de formação do professor para a criação de um ambiente favorável à aprendizagem em sala de aula e o trabalho direto com os alunos?

Adriana - Formar o professor também é um aspecto importante dessa função. É ele a principal referência para os alunos e toda e qualquer intervenção ou conversa é realizada pelo próprio professor. A entrada do orientador, nesses casos, é muito pontual e se faz necessária em situações muito específicas. Cabe ao professor acompanhar cada criança e o grupo, oferecer espaços de discussão em sala de aula, pensar e propor situações que garantam a coesão do grupo e o bom relacionamento entre eles. O papel do orientador educacional é oferecer apoio necessário para que esse trabalho seja concretizado e uma das estratégias utilizadas é a observação. Observar o professor atuando em sala de aula não só nos oferece informações para pensar o plano de formação daquele professor especificamente, mas nos informa sobre os alunos – como aprendem, como se relacionam com os colegas, como lidam com a autoridade dos adultos, como se organizam, etc. Elementos essenciais para orientação de professores, famílias e alunos na construção da autonomia e na postura de estudante.

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De sua formação acadêmica, que referências teóricas são mais importantes para o trabalho atual?

Daniela - Na Orientação Educacional tenho uma identificação muito grande com os estudos de Piaget,  Vygostsky e Brunner para compreender o desenvolvimento infantil e as intervenções que podemos realizar em favor das aprendizagens. Yves de La Taille, Lino de Macedo, Marta Kohl, José Maria Puig são autores que prezo bastante. Também estudo autores da Psicanálise, como Winnicot, Freud e Françoise Dolto para ampliar meus conhecimentos.

A construção da moralidade sempre foi um foco de interesse (meu trabalho de conclusão da Psicopedagogia foi sobre: a constituição moral e de si mesmo e suas implicações nas aprendizagens) tecendo um conteúdo que defende que se a construção da moralidade é trabalhada na escola o aluno é um indivíduo mais “inteiro”, tem relações positivas e uma auto-estima que ajuda a estar motivado e interessado nos conteúdos. Desta forma, o aluno tem menos riscos de ter problemas de aprendizagens. Sabemos que muitos dos déficits têm fundo emocional.

Como Orientadora Pedagógica desta equipe de professores, meu apoio acontece nos estudos que realizamos enquanto instituição de referências importantes para refletirmos sobre cada área de conhecimento e didáticas específicas.

Adriana - Autores como Rheta DeVries, Yves De La Taille, Josep Maria Puig, Lino de Macedo, Piaget e Françoise Dolto sempre fizeram para da minha formação acadêmica. Hoje tenho revisitado esses autores que oferecem diferentes visões sobre os diversos aspectos do desenvolvimento infantil com outro olhar, do ponto de vista do orientador educacional. É interessante repensar no que esses autores podem contribuir não mais com a professora Adriana, mas com a orientadora e o trabalho de discussão sistemática no grupo de Orientadores Educacionais.

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O que identifica como preocupações centrais dos pais dos alunos das séries que acompanha?

Daniela - Uma preocupação central dos pais diz respeito a criança dentro do grupo, ter notícias do que está aprendendo individualmente, relacionando a “média” do grupo e o que é esperado para a idade e série. De fato, o grupo e cada criança são dois olhares que se complementam e fazem com que consigamos acompanhar a dimensão Educacional como um todo. Nas reuniões de pais, nos planejamentos anuais, nos blogs da escola, nos relatórios virtuais temos as notícias dos grupos. As notícias individuais seguem nos relatórios semestrais individuais e nos encontros com a orientação. É importante refletirmos que, apesar de termos objetivos bem claros para cada série, nosso foco está em compreender como cada criança pensa e modifica seu conhecimento. Qual é o tempo desta criança? Quais as ações dos professores para avançar? Como a criança responde? Como a família pode ajudar?

Adriana - Além dessas citadas por Daniela, vejo que as relações interpessoais são aspectos que preocupam muitos os pais atualmente. Como as crianças se relacionam, de que forma podem contribuir para que seus filhos tenham amigos de “verdade”, como as crianças lidam com as frustrações e que repercussões isso terá em sua vida adulta, como lidam com os conflitos dentro e fora do ambiente escolar. Tenho tratado desse assunto com certa frequência nas entrevistas com os pais.

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E que reflexões teria para compartilhar com os pais dos alunos que acompanha frente a essas inquietações inerentes ao desafio de educar?

Daniela - Que o trabalho da escola acontece em unidade. Os segmentos mudam, mas a estrutura e os princípios permanecem. Que identificamos o trabalho realizado desde pequeninos em atos de convivência, nas relações que os alunos estabelecem como grupo e com os professores e também nos procedimentos de estudante, aprendendo a estudar, explicitando os saberes.

Adriana - A interlocução entre a família e a escola, é um ótimo caminho. Esse tema costuma ser frequente, desde a educação infantil até o fundamental. O mais importante é tentar entender do que estamos falamos. Há características que são comuns às faixas etárias e podemos dizer com tranquilidade que faz parte do crescimento vivenciar certas “dificuldades” de relacionamento, cabe à escola orientar os pais nesse sentido, mas não podemos deixar de olhar para o indivíduo e para as questões que as famílias nos trazem. O contexto, a vida em família, as relações interpessoais fora da escola, o histórico da criança, pode sim nos dar  informações importantes e devem ser tratados com o rigor que merecem. Portanto, volto a repetir que a interlocução é sempre o melhor caminho. As famílias podem e devem nos procurar quando estiverem angustiadas e a escola fará o mesmo sempre que achar necessário compartilhar aspectos da aprendizagem e do desenvolvimento dos alunos.