Matemática e as aulas ajustadas - que tipo de aulas são essas?

-

Por Mariana Kaufmann e Angela De Crescenzo

Dois princípios presentes no trabalho da Escola da Vila, a interação e o atendimento à diversidade, nos colocam desafios permanentes, vinculados ao modo de organizar as situações de ensino e aprendizagem. No começo de 2013, iniciamos um projeto-piloto nas aulas de matemática dos 8ºs e 9ºs anos do F2, as aulas de ajuste. A novidade é que, uma vez na semana, dois professores estão presentes na aula de matemática. Nessas ocasiões, os alunos são organizados em grupos de trabalho, considerando as habilidades, as questões, as dúvidas observadas pelos professores no decorrer das aulas. Essas observações e, consequentemente, a organização dos grupos de trabalho são feitas pelos professores, tendo como referência avaliações parciais, participação do aluno nas aulas, disponibilidade e experiência com a disciplina, entre outros indicativos. Esses grupos não são fixos, se modificam de acordo com os conteúdos trabalhados.

Em sala de aula, os professores de matemática se revezam a fim de atender e mediar as discussões nos pequenos grupos. As atividades têm o mesmo conteúdo, embora a proposta seja diferente, tendo como foco os desafios e avanços que o grupo necessita. Logo, cada grupo irá se debruçar em propostas diversificadas.

Portanto, nessas aulas específicas de matemática, são trabalhadas algumas atividades, visando o aprofundamento da relação com a matéria. Em todos os casos, temos como objetivo apresentar desafios dentro das habilidades de cada um, tanto para os mais avançados como para aqueles que ainda precisam trabalhar algum aspecto importante. Por isso, neste tipo de atividade, propomos grupos de trabalho homogêneos, de modo que eles criem novas parcerias enquanto também são desafiados. Apesar de os professores serem os responsáveis pela elaboração dos grupos, com base no conhecimento que possuem de seus alunos, eles também implicam os alunos no processo quando os incentivam a revelar se acham que precisam trabalhar mais um aspecto ou outro de determinado tema/conteúdo. Essa é mais uma forma de o aluno se responsabilizar pelos seus avanços, suas conquistas e, consequentemente, pelo seu processo de aprendizagem.

Observemos um exemplo das atividades trabalhadas. Analisemos o problema: “O resto da divisão de um número a por 93 é 32. Ao dividir outro número b por 93, o resto é 63. É possível saber o resto da divisão por 93 da soma a + b? Se sim, explicite como e diga qual é o resto. Se não, justifique.”

Todos já haviam resolvido o problema, e cada grupo recebeu um novo desafio.

a) Para um grupo, foi pedido que produzisse um problema similar, tratando dos mesmos conteúdos.

b) Outro grupo deveria fazer uma análise metacognitiva (indicando, por exemplo, o que seria necessário saber para conseguir resolver o problema). Neste caso: 1) analisar os termos de uma conta de dividir, 2) lidar com múltiplos e divisores mesmo sem saber os valores exatos e 3) justificar usando propriedades, etc.

c) Para o terceiro grupo, a proposta foi que escrevesse uma generalização sobre o assunto, formulando, por exemplo, a afirmativa: “se temos os restos de dois números por um divisor, podemos saber o resto da soma desses próprios números pelo mesmo divisor, somando os restos. OBS: deve-se verificar se é possível dividir novamente.”

Esse tipo de proposta ajustada às necessidades dos alunos é potente. Enquanto alguns alunos conseguem atingir a maioria dos objetivos cobrados, outros precisam pausar o trabalho para revisar certos pontos. Assim, para os que não necessitam dessa “pausa”, já é proposto um novo olhar num problema que eles já conhecem. Todos têm seu objetivo naquela aula, sem que se torne nem demasiadamente abstrata para alguns, nem tão trivial para outros.

Os próprios alunos comentam as aulas: “[Em grupos] nos desafiamos a outras formas de pensamentos e jeitos de resolução do problema proposto. Já tivemos aulas em que meu modo de resolver era muito longo ou complicado, e outro integrante do grupo me mostrou uma maneira beeeem mais fácil!”

“Os trabalhos em grupos trouxeram um novo meio de estudar matemática: o trabalho de argumentações e justificativas, compreensão e consentimento.”

“Achei muito bom, pois você está com pessoas que têm o mesmo nível de dificuldade que você. Aparecem várias discussões e ideias.”

Intensificando esse tipo de dinâmica nas aulas de matemática da Escola, pretendemos, a cada dia, aproximar os alunos de suas dificuldades e de suas facilidades, identificar na matemática o senso de investigação e também encontrar em seus colegas diferentes pares de produção e discussão de ideias. O protagonismo do aluno é enfatizado, pontuando-se a mudança de papeis em situações e em contextos diferentes.