Formação continuada em Ciências Naturais

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Por Claudia Cavalcanti e Celina Moraes

Durante um ano e meio, ao longo de 2012 e 2013, o Centro de Formação da Escola da Vila promoveu um conjunto de encontros com coordenadores e professores para um trabalho aprofundado em Didática de Ciências Naturais. Os encontros aconteceram em São Paulo, Recife e Curitiba, abrangendo quase quarenta escolas, com a participação de mais de uma centena de professores e coordenadores de Educação Infantil e Ensino Fundamental.

Com base em estudos teóricos e exemplos de trabalhos realizados na escola, em diferentes séries, os participantes tiveram a oportunidade de conhecer vários princípios que orientam o trabalho de Ciências Naturais e sua relação com nossas práticas.

Iniciamos nossas jornadas com a noção sobre conceitos estruturantes, que nos ajuda na escolha de temas e abordagens num campo tão amplo, que inclui: Biologia, Química, Física, Geologia e Astronomia.

Refletir sobre o conceito de obstáculos possibilitou compreender por que alguns conteúdos se mostram difíceis de aprender e são retomados, de diferentes maneiras, várias vezes no currículo, e por que o trabalho com as representações dos alunos é essencial para a aprendizagem significativa desses conteúdos.

O papel do experimento -- na ciência e na escola -- também foi um tema bastante discutido, e possibilitou muitas reflexões sobre a construção do conhecimento na ciência e sua relação com o conhecimento construído na escola.

Por fim, nos núcleos que já haviam iniciado os trabalhos em 2012, São Paulo e Pernambuco, refletimos sobre as principais características da linguagem em Ciências Naturais e sua relação com o trabalho em escrita e leitura no ensino de ciências na escola.

Ao longo desse trabalho, esperamos ter contribuído para a construção de uma visão de ciência, que a considera como produtora de uma interpretação sobre o funcionamento do mundo, diferentemente da ideia positivista, predominante no século XX, em que era apenas descrita de forma objetiva. Discutimos, também, o quanto esse processo de produção de conhecimento, enquanto criação ou recriação, é social e, portanto, seu ensino requer a interação com outros, necessita da reflexão crítica das ideias concebidas por si mesmo e pelos demais, precisa da valoração dessas ideias não como erros ou desajustes, mas, sim, como um desenrolar de possibilidades advindas das hipóteses e concepções que surgem e circulam durante todo o processo de aprendizagem.

Partindo desses pressupostos, vimos que é possível organizar outro modo de ensinar ciências, deixando de lado a ingenuidade ao acreditar que todo experimento mostra que uma definição permite capturar o significado de um conceito; um texto científico por si só explica e sua leitura admite apenas uma única interpretação correta; e, por fim, que a linguagem da ciência está isenta de ambiguidades.

Em nossos encontros ZDP foi possível analisar e discutir a necessidade de pensar o ensino desde uma perspectiva que permita ao aluno refletir sobre uma realidade que habitualmente não se apresenta problematizada para poder chegar a perguntas e explicações aproximadas àquelas que se propõem em ciências. Sabemos que não é simples organizar as aulas garantindo a reconstrução de ideias que os cientistas levaram anos para organizar, como a queda dos corpos, se nos propusermos somente a observar o fenômeno. Por outro lado, sabemos que é possível gerar uma situação na qual o aluno adquire interesse em buscar modos para explicar o que observa, principalmente quando se depara com problematizações que instalam na aula um lugar no qual seja possível pensar, discutir e buscar respostas menos imediatas e baseadas na intuição. Mesmo que sejam respostas provisórias, já é possível começar a explicar o funcionamento do mundo.

Ao fim do primeiro ano de trabalho, já começaram a chegar até nós notícias das escolas participantes acerca da reformulação curricular na área de ciências, modificações em sequências didáticas, com a melhoria e/ou a implantação de laboratórios, entre outros resultados positivos. É esse movimento de busca de melhorias que se colhe a partir do envolvimento e da disposição dos participantes das jornadas ZDP e de um trabalho reflexivo sobre a prática.