“Mas vocês não corrigem os erros?” “O professor não exige que o aluno acerte a lição?”

03_02_2014

-

Por Vania Marincek

Essas perguntas, e muitas outras, dessa mesma natureza, surgem sempre nas reuniões de pais, especialmente quando tratamos da Lição de Casa. E estiveram em pauta novamente, nesse início de ano, nas primeiras reuniões de pais do Fundamental 1 .

Respondendo à primeira questão: corrigimos, sim, todas as lições dos alunos, mas usamos diferentes procedimentos de correção, que estão pautados na visão que temos sobre o lugar do erro na aprendizagem, e isso define também a forma como fazemos uso da Lição de Casa em nosso projeto, diferentemente da habitual, que a utiliza apenas para que os alunos demonstrem o que já aprenderam.

Aqui na Escola da Vila, ao planejar uma nova proposta para seus alunos, o professor não só se pauta nas condições de aprendizagem listadas em nosso primeiro post do ano, mas se orienta também pela convicção de que o erro é parte importante do processo de aprendizagem. Para aprender é preciso pensar sobre o que se quer conhecer. É preciso elaborar hipóteses, checá-las, incorporá-las ou rechaçá-las, enfim, é necessário haver muita atividade intelectual até se chegar à compreensão do conteúdo e, para isso, é preciso que quem esteja  aprendendo se sinta livre para poder pensar. Não pensar o que é esperado, porque é esperado que pense, mas sim, buscar internamente, naquilo que já conhece, recursos que ajudem a atribuir sentido ao novo que lhe é apresentado.

O erro, portanto, faz parte do processo de aprendizagem. Em sala de aula é importante que haja espaço para que apareça e, ao contrário do que possa parecer, em sua maioria, os erros não são aleatórios e pessoais, mas são comuns e já conhecidos dos professores em virtude da natureza de cada conteúdo e das condições de aprendizagem dos alunos em cada etapa da escolaridade. É assim nas atividades feitas em sala e também nas propostas para casa.

Um bom exemplo desse tipo de erro é o da criança que está aprendendo sobre os números. Nessa primeira semana, em quase todas as turmas de início do Fundamenta1, as professoras fizeram ditados, em que os alunos deveriam escrever os números ditados. É comum e esperado que muitas crianças escrevam os números de forma aditiva, como se fala, e o número 250, nessa lógica, se transforma em 20050. Está errado? Do ponto de vista formal, sim. Do ponto de vista do percurso de aprendizagem nos explicita que a criança está pensando sobre o sistema de numeração decimal, e o caminho que já percorreu. Ela está pensando sobre a representação dos números, se deu conta de que segue uma escrita aditiva – duzentos e cinquenta – e busca representar essa conclusão.

Esse é um erro muito bem construído e pensado, e não será a correção do adulto em casa ou na escola que transformará a forma de pensar das crianças. Será preciso haver intervenções em sala de aula, especialmente para que a criança consiga se distanciar de sua forma de pensar, e insistimos, com a qual ela está muito satisfeita porque foi resultado de sua reflexão. Para esse tipo de aprendizagem, a “correção” da lição exige mais do que um visto do professor e, portanto, não será direta e imediata. Acontecerá ao longo das ações planejadas pelo professor para que os alunos aprendam e a discussão em sala, a partir das respostas certas e erradas dos alunos, é apenas a primeira delas. Os erros nos dão pistas importantes para entender o percurso de aprendizagem de cada aluno e considerá-los nas discussões em sala traz aos alunos a possibilidade de refletir sobre seu percurso e de avançar na compreensão do conteúdo que está aprendendo.

É importante ressaltar que sabemos que existem também erros que não são conceituais, nas situações em que o que está em jogo é o aluno acessar conhecimentos já trabalhados, discutidos e reconstruídos por ele e, nesses casos, o professor fará a correção mais pontual e mais parecida com a prática escolar comum. Como exemplo, podemos pensar no ensino da multiplicação. Se os alunos estão sistematicamente pensando sobre as ideias que envolvem essa operação, se já puderam buscar regularidades nas diferentes tabuadas, se já pensaram sobre a conta armada, será esperado que  acertem as contas que são pedidas nos problemas ou nas  lições. E, aí sim, essas tarefas serão corrigidas da forma tradicional.

Quanto à segunda pergunta do post, nessas situações o professor exige, sim, que os alunos acertem a lição.

A correção da Lição de Casa, portanto, é um momento muito valorizado em nosso projeto, porque também está a serviço de promover aprendizagens. Por isso, cuidamos dessas correções, diferenciando o momento da aprendizagem dos diferentes conteúdos e as possibilidades das crianças nas situações em que apenas estão reapresentando o que já aprenderam.