“Nossa!!!!!! Professora há 19 anos e sempre ensinei os nomes das letras, sem nunca pensar se isso era importante para as aprendizagens das crianças... Tenho que fazer beeem diferente!”

Sobre ajudar o aluno a estabelecer relações entre o conhecimento novo e o que já tinha.

 14_03_2014

Por Andréa Luize

Aprender é algo inerente a qualquer ser humano, seja uma criança, um adulto, um aluno, um professor. Isto é, vivemos em constante processo de apropriação de conhecimentos e, tal qual as crianças, aprendemos estabelecendo relações entre o que já sabemos e o que nos é apresentado, o que nos é novo. Por isso, nas situações de formação de professores, esse princípio precisa ser amplamente considerado.

Cada professor traz consigo diferentes experiências docentes, diferentes informações e conhecimentos sobre temas da pedagogia, das didáticas, e diferentes crenças sobre o que é educar, o que é alfabetizar, bem como sobre seu próprio papel na formação dos alunos. E é com base nesse conjunto de saberes que esses profissionais enfrentam as ações formativas das quais participam.

Em cursos de atualização, como os oferecidos por nosso Centro de Formação, o formador sempre planeja estratégias que permitam aos participantes explicitar alguns de seus saberes, confrontá-los com os de parceiros e discuti-los à luz de pesquisas e situações de referência. Debates, análises de produções de alunos, situações em que precisam tomar determinadas decisões ou mesmo situações em que devam se colocar no lugar de alunos são algumas das propostas que objetivam a explicitação e o confronto de saberes.

Um exemplo. Em curso recente, propus aos participantes que escolhessem dentre duas afirmações opostas sobre o uso das tecnologias na educação infantil e que justificassem a opção. Depois da leitura e da conversa sobre algumas respostas, apresentei ideias mais recentes – e potentes! – sobre o tema no contexto da alfabetização inicial, proposta finalizada com a análise de dois vídeos sobre o uso significativo de tablets em classes de Grupo 1 (3 anos), aqui da Escola da Vila. Analisando os vídeos, alguns dos participantes reiteravam ideias destacadas na justificativa que elaboraram, outros repensavam suas colocações iniciais; ou seja, estavam justamente partindo de suas próprias crenças e hipóteses para ampliar, rechaçar ou validar conhecimentos sobre o tema.

Quero dizer que, nas situações formativas, quaisquer que sejam, não se pode deixar de lado o fato de que aprender está longe de ser uma tarefa fácil, especialmente quando algo contraria conhecimentos e informações nas quais nos pautamos, por vezes, durante muito tempo.

A frase que tomei por empréstimo para o título do post tem relação direta com essa questão. É muito usual que, em classes de educação infantil e 1º ano, gaste-se muito tempo didático ensinando os nomes das letras e/ou a ordem alfabética. Isso é feito, em geral, com a justificativa de que se trata de um conhecimento base para as crianças aprenderem a ler e a escrever de acordo com o princípio alfabético. Ocorre, porém, que dominar nomes de letras e a ordem alfabética efetivamente não contribui para essa aprendizagem. Não é possível explicar, brevemente, as razões desse fato. Interessa aqui, porém, apenas saber que, na maior parte dos casos, o nome da letra não corresponde ao que a criança busca escrever. Se quer escrever “casa”, saber o nome da letra “c” (cê) não traz qualquer apoio. Para essa criança, usar, por exemplo, o nome da amiga de classe, “Catarina”, é muito mais condizente.

Para contribuir com essa compreensão, em cursos sobre alfabetização, sempre planejo um momento para tratar desse tema partindo de respostas de crianças e de uma análise mais apurada das hipóteses de escrita. Aqui, muitos profissionais se veem numa situação de grande confronto: o que as pesquisas destacam, o que as crianças parecem necessitar está, muitas vezes, distante das intervenções que esses profissionais, extremamente bem intencionados, costumam colocar em prática junto a seus alunos. Alguns deles, como a autora da frase que está no título acima, se dão conta de que ensinavam algo que as crianças não precisavam e que, usando o tempo didático para isso, deixavam de ensinar outros conteúdos, muito mais importantes para os processos de aprendizagem dos alunos. Em outros casos, o incômodo que essa discussão causa é tão grande que nem é possível mudar de ideia ou mesmo confirmar suas próprias hipóteses ao longo do curso; será necessário mais tempo, mais reflexão...

Aprender pode ser mesmo árduo, e leva tempo, mesmo quando você já é professor.