Para além da lição de casa

07_07_2014
Desenho de Luana Monteiro, 5º ano B

 

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Por Cláudia Tenório Cavalcanti

 “Mãe, não consigo resolver esse problema de matemática. Olha isso, que absurdo de lição! Impossível resolver.”

Esse e outros comentários semelhantes aparecem quando estamos em casa e acompanhamos a lição de nossos filhos. Basta uma formulação de questão diferente da habitual, uma orientação mais detalhada para que aconteçam reações desse tipo, até mesmo vindas das crianças mais competentes e implicadas com as tarefas da escola.

Recentemente vivi uma dessas situações, em que a lição era para os alunos de 5º ano solucionarem o seguinte problema:

Uma loja deve R$ 60,00 a um fornecedor. Por sua vez, tem R$ 45,00 para receber de seus clientes. Qual o balanço entre o que recebe e as dívidas? 

Enquanto minha filha reclamava com argumentos do tipo: “Como alguém pode perguntar qual o balanço em um problema de matemática? Isso é um absurdo! Não sei resolver! Não sei nada de matemática”, eu me desesperava para explicar a ela o que era pedido usando outras situações semelhantes, com os mesmos dados do problema (60 e 45). Para minha surpresa, a braveza daquele pequeno ser de apenas nove anos de idade extrapolou da professora para a escola, e para minha incompetência como mãe. Para ela, minha explicação mais atrapalhava do que ajudava, e um problema que ela resolveria num piscar de olhos consumiu aproximadamente 45 minutos de nossa manhã. E, o pior, foi o meu sentimento de impotência. Saí da história como se não soubesse resolver o problema e explicá-lo de forma clara e compreensível.

Segui para o trabalho pensando sobre o ocorrido, me afastei da situação e pude olhar para além do problema de matemática e ver a lição de casa como um espaço de convivência, de relação mãe e filha, neste caso. Espaço que me revelou os medos que ela tem de enfrentar o novo. O quanto é difícil para uma pessoa de nove anos lidar com o imprevisto, o que está fora do esperado.

Eu teria ajudado mais minha filha se, desde o início, tivesse conseguido entender o que estava acontecendo para além da lição de casa. Mas embarquei diretamente no problema, como se a tarefa fosse minha. Resolvi o problema mentalmente e, assumindo o papel de sua professora, me pus a ensiná-la.

Depois de, como mãe, ter ajudado a tornar a lição de casa um verdadeiro problema, concluo, o que já sei como orientadora, que o melhor encaminhamento é o que torna a criança responsável por sua tarefa. Pedir que leia o problema, perguntar qual é a dúvida, questionar se a criança já resolveu algo parecido, fazê-la tentar lembrar-se da explicação da professora... e só. Preservar o espaço de convivência da família mostrando a ela que tem muitos recursos para lidar com situações como essa. E, se nada disso adiantar, a lição voltará para a escola resolvida do seu melhor jeito ou com a anotação de dúvidas para que a professora possa olhar para os saberes matemáticos dela. Aos pais, nesse momento, restará a filha com seus medos, receios, desejos, e uma baita vontade de “lutar” contra eles.

A lição de casa não deixará de ser espaço de confronto, mas essas ideias confortam, porque dão a dimensão do quanto cada pai ou mãe pode ajudar no crescimento de seus filhos, e deixar a tarefa de ensinar os conteúdos da escola a cargo de sua professora.