A força da Literatura

Texto produzido coletivamente pelos professores e pela coordenadora da área de Língua Portuguesa e Literatura (LPL)

Em oposição à ideia de "fortaleza", aqui entendida como espaço fechado, cercado e protegido, optamos por um trabalho com Literatura que pressupõe portas abertas para a entrada de especialistas, professores convidados, profissionais que estudam diferentes áreas do conhecimento, visitantes, mediadores, enfim, interlocutores cujos pontos de vista possam enriquecer o processo de leitura. A complexidade das obras e a riqueza dos mundos ficcionais presentes nos livros que indicamos justificam um trabalho que favoreça a expansão e as conexões, conquistas que são possíveis mediante as mais variadas situações de troca de ideias.

Dessa forma de entender a leitura surgem propostas e parcerias muito ricas e  interessantes, como as que descrevemos a seguir.

Eu, leitor - 6º ano  

A exposição Eu, leitor, montada nas unidades Butantã e Morumbi, reuniu trabalhos nos quais os alunos do 6º ano encontraram suas formas pessoais de olhar para os percursos de leituras, refletir sobre eles, comunicar os próprios perfis e compartilhar um pouco da experiência leitora.

A exposição foi visitada por Cristiane Tavares, colaboradora da Revista Emília, especialista em Literatura Infantojuvenil, formadora de professores e mãe da escola. Além de apreciar a mostra, ela conversou com os alunos que guiaram a exposição e gravou um depoimento para  ser transmitido aos alunos dos 6ºs anos, no encerramento do trabalho.

Foi uma deliciosa conversa entre leitores! Um momento especial e importante, que explicita bem a nossa forma de investir no fortalecimento de uma comunidade de leitores de literatura.

Fóruns de discussão - 7º ano

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Quem já se encantou por um livro sabe que, diante de uma leitura mobilizadora e interessante, nada é mais natural do que buscar interlocução, seja para compartilhar as impressões, seja para trocar ideias sobre os mais variados aspectos da experiência leitora. Buscamos preservar esse movimento natural dos leitores, convictos de que, na interação, a reflexão se aprofunda, à medida  que as ideias sobre o livro são exploradas e que novos significados são construídos e compartilhados. Atualmente, as discussões literárias ocorrem presencialmente, em todas as salas de aula físicas da escola, e também a distância, nos fóruns criados no ambiente virtual de aprendizagem.

O 7º ano, que conta com duas professoras de LPL, está encaminhando atualmente uma proposta realizada por quatro mediadores de leitura. Dessa forma, as portas da sala de aula ficam abertas à participação de  dois convidados, os quais, juntamente com as professoras de LPL, engajam-se na mediação das discussões de quatro grupos distintos, sendo que cada um deles está lendo e discutindo um livro diferente. Dessa forma, os leitores podem optar pelo livro que mais lhes interessa, as professoras podem acompanhar e mediar as discussões, tendo acesso à palavra de cada um dos alunos, e todos se beneficiam da troca de ideias sobre o livro.

O estranho caso do cachorro morto. Ou The curious incident of the dog in the night time

O estranho caso do cachorro morto faz parte do corpus de leitura do 8º ano há muito tempo. O título atende a muitas necessidades do currículo de LPL: amplia o repertório de narrativas protagonizadas por adolescentes, coloca o leitor em contato com os dilemas e dificuldades vividos pelas personagens, abre caminhos para muitas discussões interessantes, desafia o leitor a acompanhar a evolução de tramas paralelas e a confrontar diferentes pontos de vista sobre os conflitos abordados. Além disso, oportuniza o contato com um narrador muito peculiar, que, a princípio, exige bastante dos leitores, mas que vai se fazendo entender e cativar ao longo da leitura.

Desde a primeira vez em que o título foi indicado, há sete anos, optamos por apresentá-lo aos alunos na língua em que ele foi escrito. Para tanto, as professoras de LPL e de Inglês preparam uma aula em parceria, na qual o livro é apresentado no idioma original e os primeiros capítulo são lidos em inglês. Fica, assim, o convite para que o aluno faça uma escolha: tanto pode ser lida a ótima tradução feita por Luiz Antonio Aguiar e Marisa Reis Sobral, quanto pode ser escolhido o original. Dessa forma, diluem-se as fronteiras: tendo em vista que a leitura literária está presente tanto nas aulas de inglês quanto nas de LPL, nada mais conveniente que aproximar as disciplinas.

Mesa-redonda formada por diferentes profissionais, de diversas áreas - 9º ano

“E esse - interveio sentenciosamente o Diretor - é o segredo da felicidade e da virtude: amar o que se é obrigado a fazer.” 

A frase anterior apresenta a essência da sociedade “utópica” descrita por Huxley em Admirável Mundo Novo. Escrita em 1932, a obra sugere um possível futuro da humanidade e retrata uma sociedade que de humana possui muito pouco. Um tempo no qual as pessoas são criadas e condicionadas em laboratório, predestinadas a ocupar uma função social específica e manipuladas para serem felizes o tempo todo. 

É essa mesma frase que dispara a leitura e as reflexões dos alunos, os quais são convidados a responder se gostariam de ser condicionados, tal qual na obra, a gostarem de tudo que são obrigados fazer em seu dia a dia. 

A leitura é desafiadora e mobiliza fortemente os alunos, que se angustiam diante da realidade descrita no livro, para a qual elaboram duras críticas. A surpresa se dá quando passam a notar semelhanças entre o mundo ficcional e o nosso próprio mundo. 

Para apoiar os alunos no enfrentamento desse desafio, foi organizada, no dia último dia 10, uma mesa-redonda com professores e orientadores convidados, que abordaram diferentes aspectos do livro. 

O historiador e professor de Conhecimentos Históricos e Geográficos (CHG) do F2, Ricardo Buzzo, tratou sobre os sentidos da liberdade e as delineações que ela adquire no livro e na nossa sociedade. 

O geógrafo e professor de Geografia do Ensino Médio, André Haind, tratou sobre as relações sociais e de trabalho e questionou: a divisão social do trabalho de acordo com o berço: Ficção ou realidade? Castas ou classes? 

O físico e professor de Ciências Naturais (CN) do F2, Alex Coelho, tratou sobre relações com o conhecimento, abordando os conceitos de ciência pura e ciência aplicada e as relações entre natureza e modernidade. 

O psicólogo e orientador educacional do F2, Tiago Lima, abordou perspectivas da psicologia, que iluminam aspectos importantes da obra, como o condicionamento. Além disso, tratou de desejo, prazer e instabilidade na construção de personagens.

Jornalismo Literário - 1º ano

No 1º trimestre do 1º ano, a leitura de Clara dos Anjos e a reflexão sobre o subúrbio carioca no contexto do século XIX, ali retratado, permitiram aos alunos do 1º ano do Ensino Médio uma análise rica da relação das personagens com o espaço, bem como o olhar delas para a dinâmica da cidade. Enquanto a leitura estava em andamento, ocorreu a viagem de campo ao Rio de Janeiro, ao longo da qual  os alunos, acompanhados pelos professores de Geografia e de Filosofia, puderam ver e refletir sobre a dinâmica da cidade, suas contradições e transformações.

Agora, no 2º trimestre, a leitura de Sete vezes rua, de João Antonio, traz de volta o Rio de Janeiro como ambiente para as narrativas que estão sendo lidas, apreciadas e analisadas. A análise da relação das personagens com o espaço passa, agora, pela memória da visita àqueles espaços. Assim a Literatura colabora com a reflexão sobre Geografia, tanto quanto a reflexão sobre a Geografia contribui para a qualidade da experiência de leitura literária.

Esses são apenas alguns, dentre os muitos exemplos que poderíamos citar: o Projeto Herói, do 3º ano do Ensino Médio, o trabalho de Arte em que os alunos produzem fotonovelas a partir de contos fantásticos lidos nas aulas de Língua Portuguesa, os debates sobre cinema e literatura, do 7º ano… Assim entendemos uma proposta forte de formação do leitor: um trabalho que dilui fronteiras entre áreas do conhecimento, que promove trocas, debates, parcerias e que cria as mais variadas oportunidades para que os alunos leiam, falem sobre livros, desfrutem de obras valiosas e desafiadoras e sintam-se sempre apoiados para apreciá-las e para enfrentar os desafios que elas oferecem.