Projeto político-pedagógico: o que comunicar à nova família

Door in Forest

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Por Susane L. Sarfatti

Em uma aula na faculdade de psicologia o professor fazia uma profunda e detalhada explanação sobre a primeira infância, suas características e conflitos, quando uma aluna o  interrompeu:

− Professor, eu entendo as suas explicações, mas a minha dúvida é: Por que os primeiros anos de vida são tão importantes para Freud?

− Ora, porque são os primeiros! – respondeu-lhe o professor.

O diálogo acima é de grande simplicidade, mas traz uma verdade: os começos são importantes, justamente por serem um primeiro momento, um marco zero. O primeiro beijo, a primeira viagem, a primeira escola, o primeiro dia de aula muitas vezes são inesquecíveis, deixam marcas. Assim, é preciso cuidar bem do atendimento inicial a uma família nova na escola, é o início de uma nova relação. Usando um pleonasmo, diríamos: é preciso cuidar com muito cuidado.

Em poucas palavras podemos definir que cuidar significa estar atento ao bem-estar do outro. Nesse caso, é preciso planejar o encontro em todos os seus detalhes para que seja um “bom começo”. Organizar o tempo, o espaço, o material, as formas de interação e, especialmente, o que abordar sobre o projeto político-pedagógico da escola.

Uma escola sem projeto político-pedagógico, o chamado PPP, é como uma casa sem teto e sem chão; pode até ter sido feita com esmero, mas só pode se localizar na rua dos bobos, parafraseando o poema “A Casa”, de Vinicius de Moraes.

O PPP é um documento que expressa a identidade da escola, reúne os princípios educacionais e pedagógicos, orienta as ações cotidianas, e não pode ser percebido somente como uma exigência legal. Ele deve ser construído coletivamente por toda a equipe pedagógica, de forma que todos se sintam responsáveis pelo seu conteúdo, se comprometam com as metas traçadas e trabalhem no dia a dia da escola concretizando-o em ações com os alunos.

Mas, o que comunicar aos pais novos sobre o PPP? Certamente, não é possível abordar sua totalidade, seja porque não seria de interesse das famílias, seja porque o tempo não é suficiente. Mas mesmo que fosse, seria preciso exemplificar a forma em que o PPP se expressa na sala de aula e na escola como um todo para a formação do cidadão que se almeja.

É importante que a família e o aluno (a depender da idade) compreendam alguns aspectos básicos do PPP por meio de exemplos:

  • Ensino das diferentes disciplinas: O professor inicia um conteúdo com uma questão/ problema para que os alunos pensem, discutam e elaborem hipóteses. Ou o professor explica o novo conteúdo e pede para os alunos exercitarem?
  • Concepção de aprendizagem: Aprender é repetir o que foi ensinado ou é estabelecer relação com outros conhecimentos já aprendidos?
  • Interação entre os alunos: Somente no recreio os estudantes interagem, porque na sala de aula o professor precisa de silêncio para explicar bem os conteúdos?Ou os alunos são colocados em duplas e grupos para discutir suas hipóteses sobre determinado conteúdo e a partir daí o professor organiza a situação didática?
  • Processo de avaliação: As avaliações servem para medir o que o aluno sabe e certificá-lo? Ou estão a serviço do aluno e do professor para que possam fazer ajustes no ensino e na aprendizagem?
  • Materiais utilizados: São adotados livros didáticos, apostilas ou materiais produzidos na própria escola? E qual a qualidade dos mesmos?
  • Carga horária para cada disciplina: São muitas disciplinas com carga horária reduzida para cada uma ou menos disciplinas com maior carga horária?

A quantidade de informação sobre o PPP às novas famílias depende não só da seleção prévia do conteúdo, mas também das questões que são trazidas pelas mesmas. Contudo, é essencial que o PPP seja percebido pelos pais não como uma carta de intenção mas, sim, que seja expresso na prática da sala de aula, no cotidiano da escola. Desta forma, será possível construir com a nova família uma relação sólida, muito diferente da “casa engraçada, sem teto, sem nada, sem parede para pendurar a rede para dormir, sem penico para pipi”.