Tempo de colheita

Festa Junina Escola da Vila

-

Por Vicente Domingues Régis

[...] Quando o verde dos teus olhos
Se espalhar na plantação
Eu te asseguro, não chores não viu,
Que eu voltarei, viu, meu coração [...].

Muitas são as histórias sobre as origens da Festa Junina. Dentre as várias referências, destacam-se relatos sobre festas realizadas para celebrar a colheita na Antiguidade, no norte da África e na Europa, no período do solstício de verão, próximo ao dia 21 de junho para o calendário atual. Nessas festas, a fertilidade da terra era celebrada com música, dança e comida, e grandes fogueiras eram acesas para espantar maus espíritos e reunir as pessoas. Com o avanço da religião cristã na Europa, as festas passaram a celebrar São João Batista, protetor da colheita, assim como Santo Antônio e São Pedro. No norte da Europa, em países como Suécia, Finlândia e Dinamarca, grandes festas acontecem nesse período, desde os tempos dos vikings, com grandes fogueiras que marcam o início do verão. Na Suécia dá-se o nome de Midsommar ao feriado mais esperado pelo país, que celebra a fertilidade da natureza em uma festa familiar, que para muitos tem mais importância do que o Natal, no qual dançar em volta de um mastro é um momento bastante marcante.

Trazidas pelos europeus que passaram a habitar nosso país desde as navegações, as Festas Juninas foram incorporadas pelos povos que aqui se fixaram, resultando, portanto, num grande encontro de culturas e costumes de diversas partes do mundo. Aos poucos, as festas foram adquirindo forma, até ganharem forte elemento de identidade regional. Das gaitas e paus-de-fita do sul, ao carimbó e às saias de chita do norte, passando pelas quermesses do sudeste, pela viola caipira do centro-oeste, e pelas festas de São João do nordeste, as Festas Juninas guardam como semelhança a celebração da colheita, a música, a dança e a fogueira. Milho, pinhão, mandioca e diversos outros alimentos são servidos em volta do fogo, com muita música, dança e alegria, ajudando a criar um ritual que marca o ciclo da natureza e a passagem do tempo. Esse ritual registra, a meu ver, o paradoxo do advento do novo versus a manutenção de antigos costumes: quando dançamos na Festa Junina celebramos a capacidade humana de compreender e controlar parte dos processos da natureza, à medida que nos entregamos à inexorável transformação da nossa cultura e da nossa vida pela passagem do tempo.

Dentro desse panorama, é curioso ver como muitos elementos da nossa festa aqui na Vila remetem a esse paradoxo. Desde os bolos de milho e de mandioca aos sanduíches de pernil, hot-dogs e pastéis. Desde a sanfona, o pandeiro e a zabumba, até a sofisticada estrutura de som que montamos, passando pelos vestidos caipiras, camisas xadrezes, laços de fita, saias de chita, chapéus de palha e botas de cowboy. São muitos os elementos que nossa comunidade escolhe para se encontrar na escola e celebrar o crescimento das crianças e adolescentes que estão conosco. Uma das explicações para a emoção que sentimos ao assistir às crianças dançarem também remete a esse paradoxo: a dança nos mostra como somos capazes de nos organizar coletivamente e reverenciar antigos costumes, ao passo que acolhe a individualidade de cada um, na sua maneira particular de dançar e no seu processo de crescimento.

Mas, e a nossa fogueira, onde se encontraria na festa? Será que um elemento tão importante das Festas Juninas não poderia compor a nossa festa? Não temos o costume de fazer uma fogueira. São muitas crianças juntas, e lidar com o fogo nessa situação acaba gerando grande apreensão. Entretanto, é importante lembrar que o fogo é um dos símbolos atrelados ao conhecimento. Segundo uma interpretação do mito de Prometeu, por exemplo, o fogo roubado representa a audácia humana em busca do saber e sua vontade de compartilhá-lo. Acredito que, em nossa Festa da Colheita, aqui na escola, celebramos o ciclo de renascimento dos saberes e dos valores que cultivamos, em nossa eterna insistência em nos organizar coletivamente para saudar nossa ancestralidade e receber o desconhecido.

Veja as fotos da Festa Junina no Flickr da Vila:

Unidade Granja Viana

Unidade Morumbi, F1, álbum 1

Unidade Morumbi e Butantã, F1, álbum 2

Unidade Morumbi e Butantã, F2, Ensino Médio e ex-alunos, álbum 1

Unidade Morumbi e Butantã, F2, Ensino Médio e ex-alunos, álbum 2