“Já que cheguei, acho que tirar meu filho só meia hora mais cedo não atrapalha...” Será mesmo?

14_4_2014

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Por Daniela Munerato

A noção de tempo da criança é muito diferente da do adulto. O tempo para elas é marcado pela rotina, pela continuidade, e é esse conhecimento de rituais, de suas atividades habituais, que as deixa seguras.

Quem já não acompanhou a ansiedade de uma criança por um evento que acontecerá ao final de um ano, como viagens, ou em outros períodos, como aniversários? Isso se revela na fala do pequeno em uma espera que parece não ter fim, a qual traz angústia e inquietação.

Através de suas experiências, a criança observa ciclos como a primeira referência de que o tempo passa.

"Organizar as ações no tempo dá à criança a possibilidade de constituir uma história pessoal, de pensar em passado", afirma Lino de Macedo, docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). "Com isso, ela pode reconhecer seu repertório, sua trajetória como indivíduo, e vai delineando sua identidade. Por mais que inicialmente isso tenha de ser feito com a ajuda de pais e professores.".

No ambiente escolar, as crianças progressivamente se apropriam da rotina, fato que apoia a aquisição de autonomia, na previsão de condutas e procedimentos importantes para as aprendizagens e o convívio. Sabem, por exemplo, que, no início do período, são recebidas com cantos de escolha, compreendem que esse é o momento de entrar, conversar, com direito ao colo do professor ou a combinados com os amigos do que farão no parque, por exemplo.

Para o adulto, interromper essa rotina, chegar meia hora mais tarde ou pegar a criança mais cedo, é simplesmente um ajuste, um deslize ou uma necessidade de trânsito de uma situação a outra, num olhar prático. Para a criança, porém, a situação que até inicialmente pode gerar ânimo pela novidade que representa, na verdade, revela perdas. Situações eventuais podem acontecer, como precisar sair mais cedo por motivo de doença ou necessidade de uma consulta médica. Nesses contextos, a criança lida com o sentimento da perda pontualmente, mas quando essa perda se torna constante, o sentimento é de estar fora do grupo.

“Estar fora do grupo” se traduz pela perda de uma brincadeira que havia sido combinada, de uma história esperada, de um momento de escolha de jogo ou de notícias que antecipam momentos importantes do dia ou da semana seguinte. Afinal, muito se faz em meia hora!

O olhar do adulto não é o da criança. Mas precisa considerar o olhar desta num movimento de contribuir para que as atividades escolares aconteçam tranquilamente e em seu tempo previsto, como oportunidades importantes na vida de nossos pequenos, que estão em plena construção de vínculos e conceitos.