Mentalidade de aprendizagem, academic mindset ou a nossa velha e boa postura de estudante!

Por Sonia Barreira

Uma das ideias mais interessantes que entramos em contato e vimos utilizada nas muitas escolas que visitamos na Califórnia, entre tantas outras, é algo um pouco difícil de ser traduzido para o português:  academic mindset.  Esse conceito já me intrigava antes de sair do Brasil, quando comecei a conhecer o material utilizado na metodologia PBL (Project Based Learning) e Deep Learning.

Foi na High Tech High que tivemos a primeira boa explicação, que nos foi dada por um animado professor de inglês e humanidades, sobre as pesquisas na área educacional que dão suporte a esse princípio pedagógico. Mas, o que mais me ajudou a compreender o conceito foi o contato direto com os alunos em situações variadas de aprendizagem. Tentarei me explicar.

Academic mindset seria, grosso modo, a percepção sobre a capacidade para aprender, que um indivíduo tem de si mesmo, a qual se traduz, se concretiza, numa disposição efetiva para o aprendizado em diferentes situações escolares.

 [embedplusvideo height="300" width="400" editlink="http://bit.ly/1lY9TJL" standard="http://www.youtube.com/v/SJjIKfIsPDk?fs=1" vars="ytid=SJjIKfIsPDk&width=400&height=300&start=&stop=&rs=w&hd=0&autoplay=0&react=1&chapters=&notes=" id="ep2547" /]
Aluna apresenta, para um grupo de professores brasileiros, um projeto desenvolvido nas áreas de Ciências. Neste projeto eles criam super heróis que explicitam conceitos da física e elaboram uma história em quadrinhos para a finalização do trabalho.

Um dos princípios do movimento deep learning orquestrado por várias escolas e organizações educacionais, atualmente, nos Estados Unidos, é levar o aluno a construir essa percepção positiva, ou seja, as atividades e propostas são desenhadas para favorecer o processo de aprendizagem, mas devem ser feitas de tal forma que gerem, além da aprendizagem em si, uma forte disposição para aprender.

Imediatamente relacionei essa ideia geral àquilo que costumamos chamar de disponibilidade para a aprendizagem ou, de modo mais frequente, “a postura de estudante”. Na Vila, sempre nos preocupamos com a construção dessa postura, mas muito mais no sentido de um novo papel social, assumido progressivamente pelo estudante, do que propriamente como uma disposição interna.

 [embedplusvideo height="300" width="400" editlink="http://bit.ly/RrmDgp" standard="http://www.youtube.com/v/sPEUM2TuzwY?fs=1" vars="ytid=sPEUM2TuzwY&width=400&height=300&start=&stop=&rs=w&hd=0&autoplay=0&react=0&chapters=&notes=" id="ep8445" /]
Alunos de quinto ano explicam o projeto do qual estão participando e discutem qual é o maior desafio que têm para enfrentar neste momento de sua produção. Clareza dos propósitos, identificação do esforço necessário.

O professor nos explicou que essa percepção comporta quatro aspectos, todos fundamentais para o sucesso do aluno na escola – e isso está bastante comprovado em inúmeras pesquisas e estudos que partem da identificação dessas características nos variados grupos de alunos.

A primeira condição é a percepção de fazer parte de uma comunidade de aprendizagem. Mais do que uma obrigação ou uma rotina, o estudante deveria construir um sentido de pertencimento a um grupo cujo propósito comum é aprender. Para tanto, o aluno precisa ter uma ideia bastante clara do que fazem seus pares e por que o fazem. Ele deve conhecer o repertório institucional e saber explicar a razão pela qual são levados a esta ou aquela atividade. Em função disso, a cultura da escola deve ser bastante evidente, sustentada por um discurso compartilhado e reiterado.

A segunda condição é a percepção da capacidade pessoal de enfrentar a tarefa proposta. Isso tem a ver com o tamanho do desafio proposto aos alunos, se frequentemente mais alto do que podem enfrentar, constroem uma relação de distanciamento e superficialidade. Quando propósito e sentido das atividades são compartilhados, o aluno pode entender seu papel no processo e engajar-se de modo efetivo, tomando a responsabilidade da tarefa para si.

A terceira condição relaciona-se com a convicção de que o esforço empreendido nas situações vividas é responsável pelo desenvolvimento de competências. O aluno constrói, ao longo de sua experiência escolar, a percepção de que, quando a tarefa é fácil demais, e ele a realiza sem esforço nenhum, não há avanço ou desenvolvimento de suas capacidades, e que o esforço para aprender faz parte do processo de aprendizagem. Esse aspecto é extremamente reforçado e trabalhado, mas não por meio de ameaças ou competições extremadas; há uma busca pela conscientização do aluno desde cedo.

E, por fim, a última condição é a atribuição de valor ao que se está aprendendo ou construindo. Os alunos se orgulham de seus produtos e projetos, acham que eles têm importância e valor, além de ajudá-los a aprender. Não convivem todo o tempo com a ideia de que devem aprender para usar, num futuro distante. Ao contrário, empenham-se, porque desejam que o produto de seu trabalho seja visto por todos.

 [embedplusvideo height="300" width="400" editlink="http://bit.ly/1lYaTO8" standard="http://www.youtube.com/v/8eimW7dexmw?fs=1" vars="ytid=8eimW7dexmw&width=400&height=300&start=&stop=&rs=w&hd=0&autoplay=0&react=1&chapters=&notes=" id="ep8919" /]
Alunos do Ensino Médio se apresentam para o grupo de visitantes, contam em que estão trabalhando e, em seguida, monitoram a visita mostrando todas as instalações e explicando com propriedade todos os projetos que estão sendo desenvolvidos em cada turma!

Esses quatro elementos formam o academic mindset e todos eles devem ser trabalhados nas situações escolares, uma vez que são crenças e valores que podem ser construídos e desenvolvidos na vida escolar. O que vimos nas escolas que visitamos na Califórnia foi um conjunto de ações intencionalmente concretizadas, voltadas para a construção desta percepção. A forma de abordagem dos conteúdos, questão norteadora, (need to know/necessidade de saber), a centralidade do aluno no processo de aprendizagem (voz, escolha, pesquisa), e o papel do professor (mediador, mentor, consultor) têm todos um papel importante no favorecimento da construção do mindset. Mas é a cultura escolar, invisível e intangível, que parece contribuir de modo mais efetivo para esta construção.